À
guisa da industrialização no chão amazônico: rodando exigibilidades para as AMAZONIDADES
O
processo de industrialização em seu estado bruto exige ferramentas, instrumentos
e mecanismos de política industrial ex
ante a consolidação de determinada
tendência tecnológica e ex post quando esta se efetiva em termos de
uma cultura tecnológica. Em seu estado refinado, a industrialização aponta para
o processo de inovação, exigindo, permanentemente, melhorias, incrementos e, por
fim, rupturas, quando novas tendências se interpõem.
Já
argumentei em outras oportunidades que AMAZONIDADES é algo transcendental, que
verte para possibilidades ainda inauditas. Afinal, realizar produtos e serviços
desde insumos e saberes da floresta, sob a perspectiva da ética sustentável e
sob a égide autossustentada, representa um heroico desafio histórico e mesmo
civilizatório. Não à toa propus uma categoria de análise ainda inexplorada
plenamente: growin up. Na realidade, ela é inexistente
frente às especialidades técnicas e científicas da industrialização lastreada
pelos combustíveis fósseis. Poderíamos dizer que insumos grosseiros, tais como
plásticos e isopores, cederão lugar a insumos sutis, raízes, cascas, folhas e
frutos de árvores, dentre outras fontes renováveis.
Apesar
de já serem visíveis, AMAZONIDADES ainda não predominam no mercado; ainda não
representam uma tendência tecnológica consolidada. Então, como incentivar sua
industrialização para que ganhe musculatura no mercado, via consumo permanente,
a fim de potencializar conhecimentos, negócios e acumulações?
A
expertise pátria, enquanto Estado tardio no processo de industrialização, é a
concessão de incentivos fiscais e financeiros aos investimentos e à produção,
para alavancar a substituição de importações. Isso vale desde o Plano de Metas,
reverberando na ZFM. Aplicam-se as ferramentas, instrumentos e mecanismos de
política industrial para uma tendência tecnológica já estabelecida pelos países
que construíram e que mantém a fronteira tecnológica.
Há uma estrutura
de arrecadação e cobrança que alimenta e nutre os sistemas tributários
nacionais tardios, enquanto recursos do tesouro público a financiar programas e
ações de governo para a sociedade, além das próprias estruturas, burocracias e
tecnicismo de Estado. Isso implica necessariamente em alíquotas com percentuais
médios a elevados. Vale dizer: qualquer política de promoção industrial com
base no financiamento de recursos e na concessão de incentivos fiscais somente
terá peso relativo forte se houver impacto na cadeia de custos da respectiva
produção. Não haverá atratividade para isentar o que representa pouco ou nada
nessa estrutura. Não à toa a ZFM atrai investimentos, cujas vantagens
comparativas são mantidas favoráveis relativamente a outros lugares por força
das alíquotas médias e altas de seus produtos. Não à toa, por outro lado,
observa-se as limitações do Decreto-Lei 1.435/1975.
Então,
como incentivar produtos fora do circuito tecnológico estabelecido, que financia
o Estado tardio e seus governos, com alíquotas baixas associadas ao seu sistema
tributário nacional? Isso sem considerar que os produtos, como sugerido acima,
são em sua maioria esmagadora inexistente: inauditos e transcendentes à atual
roda industrial e tecnológica.
Só será
possível, primeiramente, se um futuro desejado associado fizer parte da
cognição do capital social, no caso manauara e amazônico. Em segundo lugar, se
transmutarmos nosso DNA societário no sentido de percebermos a necessidade de
construirmos um processo de autodesenvolvimento, adotando o risco industrial e
tecnológico como plataforma de voo histórico e civilizatório, considerando o
atual sistema de produzir, distribuir e consumir mercadorias e serviços. E em
terceiro lugar, se estabelecermos um programa amplo de desenvolvimento
industrial e tecnológico, que integre as vertentes que consubstanciam a sua
promoção que é o crédito, o empreendedorismo e a inovação.
A
idealização e implementação de uma Política Industrial e Tecnológica para
AMAZONIDADES, que contenha a visão adequada de uma perspectiva histórica e
civilizatória sustentável e autossustentada, deveria ser o foco dos governos,
indústria e academia. Iniciativas isoladas, sem a percepção de que uma
trajetória tecnológica alternativa exige ferramentas, mecanismos e instrumentos
próprias, tenderão a “dar com os burros n’água”. É o que poderá acontecer com
os Decretos 6.614/2008 e 8.597/2015.
O que
queremos dizer com esses argumentos? Inicialmente, que devemos entender e
aceitar que a atração de investimentos é apenas uma perna do crescimento
industrial; que sem a perna da criação o autodesenvolvimento nunca se dará,
delimitando a dependência industrial e tecnológica. Em seguida, que devemos visualizar
e modificar nossa postura histórica, sempre dependente de capital e tecnológica
exógena, o que é fato desde quando Pombal concedia incentivos para atrair
investimentos e negócios para o chão amazônico. Finalmente, que devemos
mobilizar e integrar todas as ferramentas, instrumentos e mecanismos de
política industrial e tecnológica, visando a construção de um futuro desejado
em torno de AMAZONIDADES.
Já havia
colocado em outros escritos que o desenvolvimento sustentável deve ser adotado
como um ACASO para a formulação de uma perspectiva histórica e civilizatória
que oportunize maior independência econômica e melhor liberdade política para
todo aquele que nasce, vive e morre no chão amazônico. O século XXI impingirá
em definitivo essa nova utopia para a humanidade; que ele seja o cavalo alado
que passa pela Amazônia. Todos nós devemos selar, montar e cavalgar nessa
oportunidade de ouro para a construção de um processo de industrialização e de
inovações tecnológicas associadas as AMAZONIDADES que seja longo e duradouro.
Vale
dizer: todo marco regulatório que concede incentivos fiscais para AMAZIDADES deve
estar combinados e reforçados por iniciativas inseridas no contexto conceitual
da hélice tríplice e no ambiente favorável da lógica dos sistemas locais de
inovação. Idealmente, a legislação promotora e totalizadora deve ser
complementar e suplementar. Enfim, todas as políticas públicas de governos
amazônicos devem estar recheadas com variadas fontes de financiamentos de
negócios e com diversas formas de indução de empreendedorismo, tanto
científico-tecnológico quanto profissional e especializado. Os planejamentos e
parcerias estratégicas de todas as instituições e laboratórios deverão estar
alinhados com os de empreendedores, empresários e profissionais do capital,
individual ou coletivamente no que concerne às firmas potenciais e/ou
instaladas no chão amazônico e suas representações de classe.
Além de
incentivos fiscais à jusante dos investimentos, no caso de AMAZONIDADES, que
não têm presença forte no sistema tributário nacional, exige-se a utilização de
subsídios, do poder de compra das administrações, proteção e reserva de
mercado, prêmios pecuniários à criação e exportação, subvenções econômicas, dentre
outros elementos de política industrial. À montante e à jusante devem estar
albergados com o provimento de infraestrutura econômica, oferecendo logística
integrada, qualificação profissional, objetivando bons trabalhadores, bons
gestores e bons pesquisadores, pesquisas e investigações, visando melhorias e
inovações incrementais, quiçá transformadoras.
Uma
visão de futuro que propugne o desenvolvimento de AMAZONIDADES deverá estar
ancorada na valorização da nossa identidade cultural, que privilegia nossos
hábitos e costumes, nossa gastronomia e vestuário, nossa geografia e história antes
da adoção fácil e gratuita de padrões de consumo que sustentam tendências
tecnológicas criadas alhures por alheios. A ideia não é viver isoladamente no
mundo globalizado, mas caminhar com as próprias pernas, pensando globalmente,
agindo localmente. Nesse sentido, registre-se o sucesso do laboratório de
informática da Ufam e de seus pesquisadores e empreendedores associados, que já
jogam o jogo global em suas áreas de atuação desde o chão amazônico. Mas, registrem-se
também as centenas talvez milhares de teses que se avolumam nas estantes de institutos
e laboratórios de pesquisas, sem a devida transformação de conhecimento em
negócios.
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