quarta-feira, 28 de março de 2012

RATIFICANDO O PROCESSO DE GROWING UP


Tenho utilizado esse conceito criado ao longo da minha erudição sobre o Projeto ZFM para rivalizar com o conceito de cathing up. Este último é referência na literatura mundial sobre o desenvolvimento industrial e tecnológico. O meu representa uma ousadia cabocla-tupiniquim – sujeito gaiato este, hein? – para sugerir a oportunidade histórica que Manaus tem para construir um capitalismo que tenho adjetivado de amazônico, de ordem superior, com capital e tecnologia própria e respeito ao meio ambiente e à ecologia. Então, juntando os cacos...

E por que temos uma oportunidade histórica? Porque o mundo está em guerra contra as mudanças climáticas e as armas que o chão amazônico dispõe são as amazonidades. Então, a partir da ética sustentável, temos alguma chance de construir nosso autodesenvolvimento sustentável lastreado pela realização de produtos no mercado a partir de insumos e saberes da floresta.

Mas como seria possível tal façanha considerando o determinismo econômico que a fronteira tecnológica construída pelos países centrais impinge aos países retardatários? Exatamente com a idealização de uma trajetória tecnológica alternativa incorporando as externalidades positivas do Projeto ZFM, em nível das transferências de tecnologia e o capital intelectual que emerge com o Sistema Manaus de Inovação.

Devemos ter consciência dos abismos que representam tanto a perspectiva do cathing up quanto a intenção do growing up. E elas se configuram exatamente pelo desequilíbrio entre oferta tecnológica e demanda tecnológica, admitindo que o desenvolvimento industrial, minimamente autônomo e interdependente, se dá em equilíbrio com o desenvolvimento tecnológico. O cenário relativo ao PIM está representado pela maior demanda tecnológica, pois as plantas industriais aqui instaladas são frutos de políticas industriais e tecnológicas idealizadas e realizadas em outros locais, tanto centrais quanto emergentes. Há, portanto, uma assimetria sociotécnica entre o chão de fábrica e as salas de aula e os laboratórios do chão acadêmico local. O pior elemento dessa assimetria é que há um vazio na dimensão patrimonial das firmas relativamente ao capital local no contexto da ZFM/PIM, na medida em que o crescimento econômico, relativo à indústria de transformação, é liderado por grandes marcas globais.

O cenário relativo às amazonidades, por seu turno, é igualmente assimétrico, porém com natureza inversa. É que existe em Manaus certa acumulação de saber científico e tecnológico, constituindo uma oferta tecnológica que pode ser vertido ao autodesenvolvimento sustentável, leia-se amazonidades. Porém, há também um vazio de firmas locais com poder econômico e estratégico que gere demanda tecnológica para a busca do equilíbrio com a oferta tecnológica existente em Manaus, que resulta do capital intelectual do Sistema Manaus de Inovação.

Por que escolher a construção de uma trajetória tecnológica alternativa, que constitui uma abstração àquele determinismo econômico, para lastrear um capitalismo amazônico, para consubstanciar um processo de growing up? A resposta está numa confluência sinérgica vinculada ao desenvolvimento sustentável, associando-a, ainda, ao fato de que a organização social do planeta está estruturada em Estados nacionais, que albergam o sistema capitalista que predomina no planeta, aonde as firmas nacionais acumulam lucros e apropriam conhecimento.

O importante, do ponto de vista da “negação” do processo de cathing up como estratégica de desenvolvimento, é que ao longo do século XX apenas o Japão se emparelhou na fronteira tecnológica, seguido mais recentemente pela Coreia do Sul e atualmente pela China, que promete um emparelhamento que deverá desconstruir a pax americana. E o planeta tem quase 200 países. Então, pode-se concluir que o processo de cathing up além de cruel, é impossível de ser trilhado sem firmas com capital local. O fato é que precisamos ter nossas empresas, precisamos ter nossa tecnologia, precisamos ter nossas marcas, atuando em nível global. Podemos e devemos ter um modelito coboclo-tupiniquim, considerando todas as variáveis que conformam o autodesenvolvimento sustentável. Esse modelito é o processo de growing up. Sua gestão seria realizada pelo que tenho denominado de Conselho Político-Estratégico em Prol das Amazonidades para o Desenvolvimento Industrial e Tecnológico do Amazonas.

Tempo atrás, numa primeira aproximação ao conceito, idealizei um esquema para visualizar a forma como os países centrais se desenvolvem e como os retardatários tentam se emparelhar, comparando tais trajetórias a uma trajetória alternativa, consubstanciada por amazonidades. Minimamente reformulado, é o que segue:

Trajetória Tecnológica dos Países Desenvolvidos (Fronteira Tecnológica)

Fonte: Combustíveis Fósseis



Trajetória Tecnológica dos Países em Desenvolvidos (Industrialização Tardia & Capacitação Tecnológica Tardia)

Fonte: Combustíveis Fósseis




Assim, cantaram e cantam em verso e prosa suas aldeias em escala global, determinando toda uma cultura, que, por sua vez, reproduz o pertinente processo de dominação e hegemonia política e econômica. Há, portanto, um hiato tecnológico muito mais difícil de ser percorrido do que a construção de uma trajetória tecnológica alternativa.

A construção de um capitalismo amazônico, a partir do acaso amazônico via amazonidades, tem a oportunidade de romper com esse determinismo industrial-tecnológico. O acaso amazônico está na possibilidade da construção de capitalismo em paralelo com os países desenvolvidos, mesmo a despeito de um menor capital social disponível em Manaus e na região. A fronteira tecnológica e os locais que se emparelham a ela dispõem de mais cientistas e engenheiros por milhão de habitantes do que Manaus. Entretanto, a criatividade manauara deverá estar a serviço desse propósito, de rompimento daquele determinismo, alinhada à vontade política de longo prazo de novas elites governantes, institucionais e empresariais. Essa nova ponte será estruturada em amazonidades. Do ponto de vista objetivo, a não reversão do processo histórico de construção da sociedade manauara com base em capital e tecnologia exógena determinará a permanente dependência do Projeto ZFM.

Esquematicamente, poder-se-ia visualizar da seguinte forma a lógica do capitalismo amazônico com base em amazonidades:

Trajetória Tecnológica Alternativa: acaso amazônico

Fonte: Desenvolvimento Sustentável combinado com amazonidades


Aí reside a perspectiva da informação e do conhecimento a ser gerado pelo Sistema Manaus de Inovação e pelas externalidades do Projeto ZFM na lógica de uma trajetória tecnológica alternativa, a partir do acaso amazônico, enquanto construção de um capitalismo amazônico, na medida em que, se a industrialização dos países desenvolvidos se deu do produto para o processo, a dos ainda em desenvolvimento se dá do processo para o produto. Hoje, quando os países em desenvolvimentos se aproximam da finalização de suas plataformas industrializadas, os países desenvolvidos afastam-se do produto para a lógica dos projetos, isto é, hoje o maior valor agregado está na terceirização de produção de marcas mundiais, estabelecido os mercados, para a geração de inovações tecnológicas contínuas. Portanto, produzindo aquele determinismo econômico que os países em desenvolvimento não conseguem se livrar.

Em sequência, visualizamos outra alegoria para representar a lógica da concepção do “acaso amazônico”, que contempla uma cadeia de valor, apropriando uma dada ideia para realiza-la no mercado, num processo sistêmico de criação:



O processo de invenção tem fluxo e refluxo, pois exige a incursão de melhorias e inovações perpétuas. A construção de um capitalismo amazônico geraria uma profusão de amazonidades. O acaso amazônico seria nossa arma para combater as mudanças climáticas, pois estaria condicionado à lógica da sustentabilidade, isto é, a realização de produtos e serviços no mercado a partir de insumos e saberes renováveis.

Poderíamos, ainda, adotar outro esquema para perceber as concepções de fronteira tecnológica, cathing up, growing up:



Ou seja, o processo de growing up, via amazonidades, se daria a partir da oferta tecnológica existente em Manaus, a qual serviria a demanda tecnológica pertinente, que seria criada a partir do empreendedorismo científico-tecnológico, que deve ser efetivamente induzido junto com fundos de capital de risco, que deverão ser disponibilizados para fazer frente à construção do capitalismo amazônico. A fronteira tecnológica inerente seria estabelecida através de saltos tecnológicos na medida em que as amazonidades passassem a se constituir no substrato de uma cultura sob a égide da sustentabilidade.

Finalmente, podemos visualizar, ainda, por meio de uma alegoria um indicador para medir no tempo os avanços de Manaus na construção de um capitalismo amazônico. Trata-se do que tenho denominado de Produto Bruto Manauara [PMB], constituído de firmas locais com tecnologia local realizando amazonidades no mercado, em franca concorrência com a indústria de transformação hich tech do PIM, medido pelo PIB. Vejam só o tamanho da encrenca:



Adotei o ano de 2003 como base desse desafio para sinalizar que algo já está em curso com a criação e institucionalização do sistema SECT/FAPEAM. Como tenho tido, apenas devemos acelerar o passo e aprofundar os mecanismos de gestão. Portanto, falta foco, enfrentando o problema de frente e formando consciência coletiva. Por isso, não à toa renovo a cada oportunidade a ideia do Conselho Político-Estratégico em Prol das Amazonidades, citado acima, como barracão de obra e ao mesmo tempo trincheira da construção do capitalismo amazônico. A ferramenta de gestão seria o indicador acima delineado, apontando a visão de futuro desejado, qual seja, de que em 2112, Manaus teria superado a sua dependência em relação ao capital e a tecnologia exógena determinada pelo Projeto ZFM. Nesse canteiro de obras, que se confunde com o próprio chão amazônico, a ordem seria a observância da ética sustentável.

É importante ressaltar que há um conflito entre a tese do growing up com o referencial adotado pelo estado da arte encenado pelo conceito de cathing up. O conflito está no sentido de que na realidade não se tem como fugir do que foi acumulado pela ciência, pela tecnologia e pelo conjunto total de inovações radicais e incrementais que a humanidade produziu, mas que países e firmas se apropriaram na forma de produtos, processos, serviços, marcas, patentes, lucros e conhecimento acumulados. Esse conflito é de somemos, pois está claro que na construção de um capitalismo amazônico consubstanciado por amazonidades o capital social de Manaus deve se apropriar das externalidades do Projeto ZFM. É como se virássemos a fronteira tecnológica de cabeça para baixo. E sabemos que as inversões funcionais oportunizam e robustecem novas visões, clareando novas veredas. Mas com o compromisso de avançar para a lógica do autodesenvolvimento, do caminhar com as próprias pernas, adotando como mote o acaso amazônico em sinergia com a ética sustentável como resposta civilizatória às mudanças climáticas.

O importante é o capital social de Manaus perceber que a proposta do capitalismo amazônico, embora permeado de obstáculos e desafios, traz em seu bojo a oportunidade histórica de se criar um círculo realmente virtuoso e verdadeiro de desenvolvimento. Isso em concorrência com o círculo vicioso de crescimento econômico lastreado pela dependência industrial e tecnológica que o Projeto ZFM determina, condicionando um capitalismo de ordem inferior. Observe-se que essa dependência local em relação ao global é a mesmíssima dependência que a fronteira tecnológica determina em relação à industrialização tardia e capacitação tecnológica igualmente tardia concernente aos países retardatários e até mesmo emergentes, ainda que a economia comandada pela China esteja enforcando os mercados maduros e de consumo extravagante.

Comentamos acima da necessidade de se estabelecer o equilíbrio entre oferta tecnológica e demanda tecnológica para que a economia de determinado local, de cunho capitalista, se reproduza com as próprias mãos e pernas, sob a liderança das mentes locais. Pode-se alcançar esse “equilíbrio” conquistado pelos países centrais, lastreado pelo consumo de combustíveis fósseis, consumo alienado e tecnologia nociva, no mesmo compasso da destruição do meio-ambiente e das relações ecológicas e sociais. Mas podemos construir um “equilíbrio” autossustentável, considerando as especificidades que o momento histórico determina. Esse novo valor, essa nova ideologia é exatamente o desenvolvimento sustentável. E o arsenal de guerra são as amazonidades.

A guerra, todavia, não poderá ser vencida se Manaus não estabelecer condições adequadas para se jogar o bom jogo capitalista, um jogo de ordem superior. Vale dizer, se não se estabelecer a cultura do capital de risco e se não se fomentar o desenvolvimento de amazonidades por meio do empreendedorismo científico-tecnológico, Manaus continuará pisando na maionese, literalmente patinando em relação ao autodesenvolvimento, considerando a lógica capitalista. A construção de um capitalismo amazônico envolve o estabelecimento de uma cultura correlata que conduzirá o processo para além dos governos, para além dos partidos, para além da política menor, para além dos políticos de visão imediatista. Por isso, precisamos criar e institucionalizar o Conselho Político-Estratégico em Prol das Amazonidades para que haja continuidade no tempo longo de uma política de Estado, de uma política maior, de uma visão de futuro de longo prazo.

É de bom alvitre que se registre que não estamos falando aqui da alta ciência e da alta tecnologia; daquela que demanda US$ 1 bilhão para ser aplicado pela massa crítica nos laboratórios e chão de fábrica dos locais mais avançados durante 10 anos para que a inovação chegue ao mercado. Não! Sem macular o rigor acadêmico e método científico, estamos falando da baixa ciência e da baixa tecnologia que traduza as necessidades da população e do meio ambiente em invenções realizando amazonidades no mercado. Mas, mais uma vez e sempre: o foco é a dimensão patrimonial das firmas. E, de forma complementar, exatamente como exige a lógica sustentável: investimentos verdes + tecnologia limpa + consumo inteligente.

Claro, pensamos na fronteira tecnológica, mas pensamos em construí-la ao invés de buscar o emparelhamento. Construir significa estabelecer uma dada, ou melhor, uma sequência de fronteiras tecnológicas a partir de sucessivos e progressivos equilíbrios entre oferta tecnológica e demanda tecnológica, considerando a dimensão patrimonial das firmas como referência para a formulação das políticas industrial e tecnológica. A lógica do emparelhamento está esgotada por força da proximidade de uma nova inovação radical que a economia verde promoverá nos investimentos e negócios, gerando uma nova onda, doravante sustentável, de produção, distribuição e consumo de bens e serviços. Isso sem falar que a fronteira tecnológica joga duro com quem dela se aproxima, recrudescendo as facilidades de negociações pertinentes à propriedade intelectual, industrial e tecnológica, de direitos autorais de marcas e patentes. A lógica do emparelhamento faz parte do mito do desenvolvimento econômico e do progresso social concernente ao século XX que as mudanças climáticas estão redimensionando.

A oportunidade histórica da entrada do conceito dos sistemas locais de inovações na pauta e na agenda dos governos locais e dos Estados nacionais como mecanismo para potencializar suas economias, portanto, a utilização da combinação virtuosa das potencialidades das TICs, da lógica dos arranjos institucionais associados à hélice tríplice e aos sistemas produtivos locais não pode deixar de ser apreendidas em toda a sua plenitude pelo capital social de Manaus para o desafio do autodesenvolvimento. Devemos potencializar a cultura da inovação associada à cultura do empreendedorismo científico-tecnológico e à cultura do capital de risco criando a cultura das amazonidades. Renove-se o pano de fundo da ética, da égide sustentável que permeia a cultura da amazonidades.

É preciso registrar sempre que nada tenho contra as firmas globais que nos ajudam no crescimento econômico: recolhem impostos, remuneram nossa força de trabalho, compram serviços e produtos locais, e transferem tecnologia. Nossas portas devem estar sempre abertas para elas. Mas, não as considero firmas locais mesmo que sejam constituídas sob as regras legais brasileiras e possuam sede em Manaus. Devemos ter consciência que, em última análise, remetem lucros para o país de origem, compram máquinas e equipamentos de recorrentes inovações de alhures, estão protegidas por patentes alheias, recebem royalties pagos como nossos recursos, contratam assistência técnica da matriz, enfim, demandam insumos estratégicos do ponto de vista do segredo industrial e tecnológico de alhures. Em concorrência às grandes marcas e firmas globais que operam no PIM devemos criar um exército de pequenas empresas de base tecnológica para melhor qualificar o uso e a ocupação do chão amazônico. Neste sentido, estaremos apostando na possibilidade da criação de grandes firmas e grandes marcas amazônidas, igualmente globais.

Já tenho sugerido que precisamos prover de energia vital esse processo com uma espécie de nacionalismo amazônico combinado com uma vontade de poder político institucional que assegure a continuidade da dinâmica de construção de um capitalismo amazônico. Mas esses são conceitos e definições da literatura da ciência social que preciso estudar como estudei os da literatura do desenvolvimento industrial e tecnológico. Na realidade, tenho dialogado com um amigo do e no chão institucional sobre a questão, procurando estabelecer um compromisso de estudo e investigação das causas nacionais e locais que determinam nossa sina da tardialidade e da associada dependência frente aos pressupostos do desenvolvimento econômico, e de seus antídotos para fins do autodesenvolvimento.

Nessas ocasiões sempre me lembro de Visconde de Pombal, que gerou a primeira malha de incentivos fiscais para atrair investimentos para a Amazônia colonial; sempre me lembro de que D. Maria, a louca, mandou destruir todos os teares da Colônia para atender ao Tratado de Methuen, que beneficiava a indústria têxtil do Império Britânico em contrapartida do vinho português; sempre me lembro de que a Rei mandou salgar a casa e o local aonde Tiradentes nasceu e viveu para arrancar pela raiz a busca de possibilidades de maior liberdade política no Reino; sempre me lembro de que o momento de reconhecer a independência do Brasil representou abrir mão do estágio mais avançado que a Amazônia disponha em relação ao centro hoje mais dinâmico do país; sempre me lembro de que o gabinete imperial não só não incentivou como obstaculizou o empreendedorismo de Visconde de Mauá; sempre me lembro de que nossas elites preferiram desfrutar do fausto da borracha ao invés de construir as bases do autodesenvolvimento; sempre me lembro de que as drogas do sertão sempre foram objeto de comercialização ao invés de agregação de valor; sempre me lembro de que nossas elites nunca cobraram das elites nacionais o financiamento que o fausto da borracha proporcionou na formação industrial e tecnológica do centro dinâmico do país; sempre me lembro de que a indústria nacional de base nasceu por concessão do Tio Sam em troca de um espaço aliado avançado após momentos históricos de quase-identidade nacional com o Fuhrer e/ou com o Duce; sempre me lembro de que o Fundo Constitucional reservado ao desenvolvimento da Amazônia sob a gestão da SPEVEA/SUDAM nunca chegou a ser formado e aplicado; sempre me lembro de que a primeira política industrial do Brasil foi a de JK cuja natureza de industrialização tardia contrastava com a primeira política industrial do Tio Sam de Alexander Hamilton cuja natureza privilegiava a criação de firmas locais e o desenvolvimento de tecnologia endógena elaborada duzentos anos antes; sempre me lembro, enfim, que continuamos acomodados com a solução parcial, incompleta e, sobretudo, dependente do Projeto ZFM.

Ou seja, ou construímos uma visão de futuro associando-a ao autodesenvolvimento, ou continuaremos a ser o almoxarifado do planeta, espaço “avançado” de reprodução de capital estrangeiro e objeto de políticas públicas tratadas por sujeitos que não vivem na Amazônia.

Cabe aos amazônidas construir uma visão de futuro desejada, que não seja a eterna dependência de plantas industriais de alheios e de alhures! A construção é coletiva, decerto, mas cada indivíduo deve propor um tijolo. Do ponto de vista desta forma ordinária, a tese do growing up segue ratificada! Aqui growing up se confunde com trajetória tecnológica alternativa vertida as amazonidades enquanto projeto de construção de um capitalismo amazônico. A denominação growing up não deve ser entendida como um paradoxo; está posto apenas para rivalizar com seu concorrente cathing up. Amazonidades significa desenvolvimento com a floresta em pé, mas explotando o capital natural da Amazônia! Explotar significa tirar proveito econômico de determinada área, sobretudo quanto aos recursos naturais. Que essa explotação seja com capital local e tecnológica endógena!

Devemos, portanto, promover uma inovação político-institucional a partir da recombinação de variáveis de desenvolvimento para enfrentar a dependência ao capital e à tecnologia exógena e ao mesmo tempo enfrentar as mudanças climáticas. Essa inovação político-institucional transitará do dito, da materialidade hich tech insustentável para o inaudito, para a transcendência das amazonidades sustentáveis, como símbolo, como desafio, como compromisso de uma nova experiência civilizatória na Amazônia, cuja ideologia é exatamente a égide, a ética da sustentabilidade combinada com as exigências do autodesenvolvimento.

Hoje, todos no mundo inteiro estão falando em economia verde. Trata-se de uma exigência do planeta. Para a Amazônia, para os amazônidas, trata-se de uma oportunidade histórica imperdível, pois amazonidades converge para o contexto da economia verde. Apenas com uma especificidade adicional pertinente ao autodesenvolvimento, isto é, de que o mito do desenvolvimento se desdobre no chão amazônico com capital e tecnologia endógena realizando produtos e serviços no mercado a partir de insumos e saberes da floresta.

Malbaratando conceitos correlatos à inovação e a difusão tecnológicas que permeiam a lógica cathing up, podemos dizer que devemos pretender superar a path-dependence que a trajetória tecnológica hich tech determina na economia manauara ao confinar as iniciativas de negócios a um lock-in vinculante. Esse é um padrão alocativo que pode ser transformado e transvalorizado num outro padrão associado a uma trajetória tecnológica alternativa lastreada pelas amazonidades. Um novo padrão convergente à lógica da economia verde que as consciências coletivas nacionais, formatando uma consciência global, começam a impor aos agentes e atores políticos e econômicos de todos os locais do planeta. Os mecanismos e as ferramentas da economia evolucionária, e de suas pertinentes políticas industriais e tecnológicas, podem oferecer a oportunidade para essa transição obrigatória.

Caso contrário, aceleraremos os passos para a extinção da espécie humana junto ao desenrolar dos séculos e milênios e ainda perderemos a dinâmica econômica que o século XXI determinará, ou a ela chegaremos tardiamente como a história sugere ser a sina do chão amazônico.

Essa é a oportunidade histórica ímpar para a Amazônia como tenho dito, pois o cavalo alado está passando no chão amazônico pelos portais da história, junto às barbas amazônicas, aqui&agora. Ou seja, a perspectiva de futuro relativa a construção de um capitalismo amazônico, via growing up, sob a ótica da economia verde representa um lock-out [aqui, diferentemente do determinismo econômico derivado da economia clássica e neoclássica, representando necessariamente o sucesso da trajetória tecnológica alternativa], superando a inércia do capital social de Manaus quanto aos desafios do autodesenvolvimento sustentável, minimamente autônomo e interdependente. Para tanto, temos a faca e o queijo nas mãos, representado pelo Sistema Manaus de Inovação e pelas externalidades do Projeto ZFM. Falta vontade de poder, vontade política, visão de futuro e ações consentâneas e convergentes. Devemos trabalhar hoje, para desfrutar de verdadeiro orgulho no futuro. Hoje não há orgulho, há contentamento e acomodação, pois jogamos um jogo de natureza inferior, movidos por capital e tecnologia exógena e sem observância da ética sustentável. A natureza do capitalismo ainda é a mesma em qualquer local do planeta; a humanidade apenas começa a [re]qualificá-lo sob as exigências da ética sustentável.

Agora, a cultura da inovação tecnológica só será potencializada, a cultura do empreendedorismo científico-tecnológico somente será estabelecida e a cultura do capital de risco somente será induzida se, e somente se, a maioria ou pelo menos 50% do total de todas as pesquisas financiadas em Manaus e na Amazônia forem com considerações de uso, vale dizer, se forem orientadas, direcionadas para o mercado, para a explotação de amazonidades, realizando de forma sustentável produtos e serviços a partir de insumos e saberes da floresta. Precisamos, no mesmo diapasão, que nossa ciências econômicas estude e transmita ensinamentos da economia evolucionária, que nossas ciências da natureza e engenharias desenvolvam e apliquem conhecimentos para potencializar amazonidades e que nossa ciência sociais observe e investigue nosso nacionalismo amazônico. Nesse compasso, daqui a 100 anos, o que hoje é inaudito poderá estar dito.