Impressões
de uma institucionalidade perdida: expectativas de futuro
Falo da Suframa, a organização que alberga minha
profissionalidade por 31 anos. Gostaria que as condições institucionais fossem
diferentes. Mas a tendência é da sua extinção, salvo haja um governo estrategicamente
forte. E ainda assim faltaria muito, senão vejamos:
De plano, revejo meu idealismo ao ajudar a organização
na implantação do programa de interiorização. O que houve? Havia, por um lado,
boa vontade com uma sistemática criteriosa para potencializar as condições infra
estruturais e econômicas do chão amazônico. Por outro, todavia, prevalecia a
perspectiva da política minúscula, aquela que retarda e até mesmo impede a
realização de projetos. Resultado? Não avançamos e estamos obstaculizados com
os passivos do macularam a estratégia do programa. O programa representa uma
moeda onde sua dupla face deve estar em sintonia com o autodesenvolvimento. Só
com essa ética poderá ter sucesso!
Em seguida, relembro o ideário de transformar os
investimentos em P+D decorrentes da Lei de Informática num grande impulsionador
de uma ambiência inovadora para Manaus. Aqui, estancamos numa grande encrenca,
pois não conseguimos perceber que as firmas que trazem seus pacotes
tecnológicos prontos, reproduzindo seus capitais por meio do cumprimento de
PPB, não têm intenção real de aplicar os recursos financeiros compulsórios no
desenvolvimento de melhorias e inovações. Em caráter específico, até criam seus
institutos. Não obstante, pode-se perceber que, no geral, a caixa sistêmica do
processo de inovação decorrente apenas aponta para inputs, deixando muito a
desejar nos outputs.
O CBA, enfim, todos já sabemos. Continua à mercê do
egocentrismo do tecnicismo estatal, que impede sua emancipação. Perdemos 14
anos com a não–implantação imediata da FAPEAM, pós Constituição Estadual de
1988, estamos perdendo outros iguais com a indecisão concernente a esse
importante mecanismo de autodesenvolvimento. Uma grande indecisão histórica?!
A TSA é o novo mercado de trabalho para advogados, que
oferecem às firmas incentivadas pendengas judiciais para suspensão de
pagamentos futuros e resgates pretéritos. Ao que parece, argumentando a inconsistência,
no sistema tributário, da sua base de cálculo em confronto com a de tributo. A
isso, soma-se a definitiva perda da autonomia financeira em decorrência da
conta única da União.
Administrativamente, vimos perdendo status com as
administrações que geram problemas frente ao bom e regular ordenamento da coisa
pública. Essa tendência é antiga, pois vem desde o escândalo do colarinho
verde, adoçado com o do açúcar, desbravado até os atuais processos
administrativos e policias.
Portanto, a Suframa está em cheque em quase todas as
dimensões. Só funciona a expertise básica da aprovação e acompanhamento de
projetos, que roda praticamente de forma quase mecânica, sob as rédeas do MDIC[1]. E tudo poderia ser
diferente. Como? Bem, poderíamos imaginar que:
1. O
chão amazônico poderia estar recebendo benefícios efetivos com a aplicação dos
recursos financeiros gerados pelo Projeto ZFM para a expansão e a melhoria de infraestrutura
econômica, para a formação de capital humano técnico e especializado, para a
promoção de P+D+I vertido às amazonidades, e para o estabelecimento de produção
de pequena monta e com tecnologia universal. Mas não: os recursos financeiros
se foram; e há uma montanha de processos em tomada de contas especiais.
2. O
sistema local de inovação poderia ter sido potencializado com avanços no mercado
em nível de redução de custos, aumento do faturamento, melhorias&inovações
de processos e produtos transmutando os PPBs. Royalties & patentes?! Um
sonho perdido!? Mas não: há uma montanha de relatórios acumulados para análise.
Além disso, parte dos recursos é retida em nível nacional.
3. A
bioindústria poderia estar sendo um acaso amazônico engatinhando para um futuro
brilhante. Mas não: qual foi o produto que o CBA conseguiu contribuir com
pesquisas para fazer entrar uma amazonidade no mercado? Sabe-se da redução
drástica de seus quadros. Quais são suas parcerias estratégicas consolidadas
com institutos e laboratórios de pesquisas? Qual o estado de seu ativo
patrimonial, especialmente suas equipamentos e ferramentas de investigações
tecnológicas? Não se tem notícias.
4. A
TSA poderia constituir uma fonte de arrecadação segura e estável. Superado o
questionamento do caráter do preço público, gerado pela representação da classe
patronal, poderia ter sido dimensionada em bases jurídicas duradouras. A base
política local poderia ter argumentado a manutenção da autonomia financeira da
Suframa frente ao estatuto da conta única. Houve uma grande inabilidade e uma
terrível falta de perspicácia. Mas não: além de ter caído a ficha de que os
recursos financeiros gerados com o Projeto ZFM não mais fazem parte de
contingenciamentos, as taxas arrecadadas estão ficando sob o crivo da espada da
justiça. O Estado do Amazonas talvez seja o maior interessado em cair de vez a
obrigatoriedade da TSA, isto é, dela ser extinta, na esteira da extinção da
Suframa, pois ampliariam suas margens de manobras em termos de políticas
públicas com o uso do ICMS.
5. A
Suframa poderia estar institucionalmente forte, revisando permanentemente seu
conteúdo estratégico, avaliando ameaças e oportunidades, revisando,
redimensionado, melhorando e inovando seus procedimentos. Mas não: seu plano de
diretrizes e políticas restou num quadro amorfo pendurado em suas salas,
denunciando a perda da dinâmica histórica com os passivos, as encrencas e as
indecisões, afora a inabilidade política. Agência Executiva? Não sei. De nada
adiantará uma nova natureza jurídica, sem condições para operar a ópera para
além da ZFM. Talvez sirva apenas para repassar atribuições e competências para
outrem, como é o caso do cenário pessimista. Dizem que a nomeação de uma jovem
e bonita política local ainda está em jogo. Que ela tenha boa sorte!
Penso que a bola da vez será a RFB. E seria um ganho
estupendo para o Amazonas. A RFB poderia constituir um Departamento da ZFM,
levando para as suas bases as unidades administrativas e os sistemas
operacionais essenciais para o funcionamento do Projeto ZFM. A sede da Suframa viraria um museu industrial,
para expor criações e invenções de alheios de alhures. Os servidores seriam
distribuídos para órgãos públicos federal. O Decreto-Lei n.º 288/1967 seria
redimensionado. E todos viveriam felizes para sempre!
A incorporação das vantagens comparativas junto ao
sistema tributário nacional geraria um gap
tributário perene. Nos anos 2080, pediríamos nova prorrogação do prazo de vigência
do Projeto ZFM, com base no argumento, vergonhoso porque já recorrente, de que
ainda não terá sido possível construir uma infraestrutura que viabilize
economicamente a produção industrial manauara por conta das longas viagens que
os insumos e produtos realizam. Estaria confirmada a perspectiva de continuarmos
como uma ponta de lança para a expansão do capital articulador da civilização
ocidental, fazendo jus às palavras do navegante, da época dos descobrimentos, à
serviços das Coroas espanholas e portuguesas, Américo Vespúcio à Lorenzo
D’Medici, em carta de 1503: “essas novas regiões que descobrimos e exploramos ... podemos efetivamente
chamá-las de Novo Mundo” (negritei). E todos viveriam felizes por mais 500
anos! Agora não mais dominado pela posse do território, mas pela posse da
tecnologia.
Mas, afinal, quais são as oportunidades, num cenário
otimista? O que poderia ser feito então para resgatar uma presença mínima da
Suframa junto à nossa responsabilidade histórica com o mito do desenvolvimento?
a) Quanto
ao programa de interiorização: elaboração de planos de trabalho para aplicação
com recursos financeiros não-reembolsáveis internamente, pelos especialistas da
área de estudos econômicos e empresariais, para apresentação aos políticos, que
correriam em busca de emendas parlamentares, aproveitando a expertise da
Suframa com a ferramenta convênios. Ponto! Nessa inflexão, que sai da inércia
para a pró-atividade, resgato reflexão contida na dissertação mestrado
profissional deste servidor, de 2001, intitulada “Projeto ZFM: vetor de
interiorização ampliado! ”, qual seja, de transferir a posse dos projetos de
produção financiados, realizados em parceria com o Pronaf, para as associações
e cooperativas, via autorização do parlamento municipal, numa espécie de mini programa de privatização. Mas para essa estratégia dar certo, precisaríamos entrar no
terreno profícuo da política maiúscula. Essa perspectiva não é trivial muito
menos fácil, mas possível desde que tenhamos boa vontade e vontade política.
b) Quanto
aos investimentos de P+D decorrente da Lei de Informática: negociar com o
capital incentivado a possibilidade da redução da alíquota de 5% do faturamento
para algo como 3% ou mesmo 1,5%. Mas dedicado a um Fundo Local, longe da
ingerência do Planalto Central e das instituições do Sistema Nacional de
Inovação, para investimentos no desenvolvimento de pesquisas com considerações
de uso, indutor de negócios lastreados por amazonidades. Aqui, precisaríamos de
boa vontade e vontade política dos atores da Hélice Tríplice, isto é, tanto do
governo, indústria e academia, para gerir com eficácia e eficiência esse Fundo.
Ponto! Para esse desiderato resgato a ideia da criação de um Conselho Político
de Gestão Estratégica para o Desenvolvimento Industrial e Tecnológico vertido
às amazonidades, visando o equilíbrio da oferta versus demanda tecnológica da
bioindústria local que deve emergir e prosperar, enquanto plataforma para o
autodesenvolvimento. Essa ideia está contida no “Pequeno Ensaio em prol da
Construção de um Capitalismo Amazônico a partir de Manaus”, de autoria deste
servidor, publicado em 2011.
c) Quanto
ao CBA, este deve passar para a esfera do Sistema Estadual de Inovação, sob a
gerência do Estado do Amazonas e vinculado à Universidade do Estado do
Amazonas. Ponto! Haveria uma concorrência saudável e sadia entre o Sistema
Nacional e o Estadual de Inovação, com dois trinômios de agentes atuando em
prol do autodesenvolvimento: [(Ufam+Inpa+Embrapa)+(UEA+CBA+IDAM)]. Nada de Inmetro
ou quaisquer outras instituições não locais para geri-lo.
d) Quanto
a TSA, esta deve se ajustar a base de cálculo à condição de sua natureza
tributária, apostando na legalidade da Lei n.º 9.960/2000, isto é, a incidência
da taxa deve ser estrita ao serviço prestado, ainda que com a possibilidade de
ser metrificado pelo volume da carga, por exemplo. Em outras palavras, não deve
ser a mesma de tributos, que incide sobre valores das transações comerciais de
importação e de internamento de mercadorias. Certamente a arrecadação cairá,
mas não será mais questionada em juízo. Ponto! Aqui exigiria um novo ponto de
inflexão institucional, quando a Suframa deixaria de ofertar, passando a
demandar recursos para financiar seus objetivos estratégicos. Novamente seria
fundamental uma boa vontade e vontade política heroica e hercúlea. Um governo
estrategicamente forte poderia, quem sabe, abrir mais uma exceção à lógica da
conta única, até para fazer valer a legitimidade da Lei n.º 9.960/2000,
devidamente legalizada.
e) Quanto
à Suframa em si mesma, além de um plano de carreira competitivo, precisaria de uma equipe
dirigente competente, profissional e séria. Ponto! Virou moda na Suframa a
gestão com não titulares, isto é, com substitutos e substituições. Isso gera
insegurança e displicência. Precisaríamos transcender as eras das festas e das
falácias. Pontuar avanços e retrocessos, aprofundando as janelas de
oportunidades e transformando ameaças em oportunidades. Caberia uma redução
temporária da estrutura organizacional, super ambiciosa, até que novas condições
objetivas se interponham para que uma atuação institucional estratégica pudesse
ser possível.
Hoje faz 31 dias que sai da greve. E os meninos e as meninas,
apesar das baixas no front, continuam
firmes e fortes. Admiro a posição dessa juventude, que desejo tenha uma atitude
pura, reservada à perspectiva da boa e justa remuneração. Mas continuo não
acreditando na greve enquanto solução estrutural. Além da necessidade de o
plano de carreira ser aprovado, que beneficiaria os profissionais e suas
famílias, precisamos resgatar ou reconstituir as condições objetivas
institucionais vertidas ao autodesenvolvimento minimamente autônomo e
interdependente, para que a sociedade amazonense/amazônica possa superar a
carência de uma solução definitiva, que traga liberdade política e
independência econômica para o chão amazônico, desde a contribuição histórica
da Suframa para além do Projeto ZFM.[2] Caso isso não aconteça, o
vazio institucional se aprofundará, mesmo com a conquista de um plano de
carreira competitivo. Sem falar na possibilidade do sindicalismo continuar se arvorando
no chão institucional, sombreando rusgas entre o passado e o presente, portanto, construindo
um futuro com base em mágoas e prepotências. A ocupação dos espaços no chão
institucional deve ser com base na experiência e na competência, sob o manto da
meritocracia; e não como resultado de caça às bruxas, para queimá-las na fogueira das ofensas e das intrigas. Por outro
lado, sem dúvida, as greves contribuíram para a percepção de que a ZFM,
doravante, poderá ter vida própria. Se é que já não possui.
Nesse período, entre 9.6.2105 e 10.7.2015, a
organização finalmente decidiu minha nova lotação: no setor de arrecadação.
Portanto, mantendo a opção de me afastar das discussões estratégicas e de
atividades intelectuais prospectivas, progressistas e propositivas. No âmbito
das reflexões, é como gostaria de finalizar minha carreira, sem necessariamente
postular por cargos, porém, não me eximindo de responsabilidades diretivas ou,
sobretudo, de assessoramento. Apesar de ter aprendido bastante na Corregedoria,
onde cumpri minhas tarefas e fiz bons amigos, julgo que minha experiência e
conhecimento deveriam ser aproveitados em assuntos estratégicos. Afinal,
sinto-me corresponsável pela e confortável com a bolha estratégica em que se
transformaram os planos institucionais, especialmente a idealização das
políticas vertidas à inovação e ao empreendedorismo. Foi com esse intuito que
formulei demanda junto à Ouvidoria do MDIC, após ter visto cerceado meu direito
de acesso ao processo administrativo e ao Relatório da Comissão que definiu
minha nova posição na organização, cuja missiva anexo à presente reflexão.
Anexo:
Caríssimos da Ouvidoria,
Sou Antônio José Lopes Botelho, 56 anos, há 30 anos servindo
ao Projeto ZFM, na qualidade de servidor ativo do Estado brasileiro, lotado na
Suframa.
Faço contato para pedir ajuda institucional desse MDIC no
sentido de obter vistas do processo administrativo que alberga os trabalhos da
Comissão estabelecida com a Portaria 496/2014. Para tanto, preliminarmente, protocolei
requerimento junto à administração dia 25.6.2015, sem obter uma manifestação
favorável ou mesmo uma justificativa para dilatação de prazo, contados 5 dias
úteis desde o protocolo. Assim, faço opção por essa Ouvidoria, ao invés de
renovar o pedido protocolado, considerando que o atual Superintendente se
recusou atender-me, quando o procurei imediatamente antes da publicação da
Portaria 287/2015, que definiu minha nova lotação na Suframa.
Já sabedor que iria ser deslocado da Corregedoria para o
setor de arrecadação, fui tentar argumentar, esgotada as tratativas com a
Comissão, a possibilidade de ser aproveitado numa função de leitura,
interpretação, reflexão e produção de textos vertidos para abordagens
prospectivas, progressistas e propositivas. Argumentaria que, apesar da
formação básica em engenharia civil, a própria Suframa oportunizou, a partir de
1995/1996, a acumulação de experiência e conhecimento nas áreas de planejamento
e desenvolvimento. Creio que o objetivo fundamental da Comissão deveria ser o
aperfeiçoamento da gestão do conhecimento, alocando capitais humanos em
sintonia com os desafios estratégicos institucionais, governamentais e de
Estado. Passadas as dificuldades políticas com a gestão anterior, julguei que a
organização fosse aproveitar minha experiência e conhecimento em questões
estratégicas.
Já assumi o posto de trabalho na COARR, Coordenação de
Arrecadação, onde estarei à disposição para contribuir no que for possível e
necessário em suas atividades operacionais, mas reforço a possibilidade de que
o argumento exposto possa ser considerado pela atual administração ou pela que
vier tomar posse como titular da Suframa, agora por meio dessa Ouvidoria. No
mínimo, desejo saber se há algo que desabone minha profissionalidade,
construída com estudo do Projeto ZFM e dedicação à instituição Suframa.
Anexo à presente manifestação o requerimento protocolado
junto à administração e endereçado ao Superintendente em exercício, o
formulário encaminhado à Comissão e minha última publicação, para demonstrar o
resultado da experiência e conhecimento acumulados à serviço do Projeto ZFM e
da Instituição Suframa.
Atenciosamente,
Antônio José Lopes Botelho
SIAPE 401045
[1] Um eloquente e proficiente
formador de opinião local, comentando esta reflexão, informou que há “14 PPBs
travados, vetados”.
[2] Outro experiente e realizado
formador de opinião, fazendo considerações acerca desta reflexão, ponderou que
a “a prioridade da Suframa continua sendo a restauração de sua condição
autárquica. Depois disso, tudo o mais seria facilitado”.
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