domingo, 11 de dezembro de 2011

Ciclo da Borracha X Projeto ZFM

Ciclo da Borracha X Projeto ZFM[1]


I. O Ciclo da Borracha ofereceu verdadeiros benefícios à nossa sociedade, caracterizados fundamentalmente pela eletrificação de Manaus, pela construção do Teatro Amazonas e pela instalação do bonde elétrico, representando o melhor da modernidade daquela época. Não obstante, os recursos financeiros carreados para a região foram “insuficientes” para a promoção do seu desenvolvimento econômico autossustentado. Ou seja, perdemos uma preciosa oportunidade de nos inserirmos positivamente no jogo político-econômico nacional e internacional. Este é o fato histórico; as razões ficam para as pesquisas sociológicas.
A revisão e questionamento daquelas razões, no entanto, deveriam vir à tona para o conhecimento de toda a sociedade amazônida, a principal perdedora do processo de não-inserção da nossa região numa alternativa socioeconômica reprodutora “em si” e “para si”, porque está a parecer que aquelas razões reproduziram-se, à medida em que:
II. Decorrem quase três décadas de operação do Projeto ZFM [na realidade, caminhamos para meio século] e a região amazônica continua carente de um horizonte libertário das amarras delineadas pela expansão do capital industrializado da economia globalizante.
Ou seja, o Projeto ZFM e a região amazônica atraiu, como lhe devia, investimentos representantes da primeira linha tecnológica, fazendo estabelecer na região, por exemplo, um setor industrial digno de reconhecimento, se não internacional, certamente latino, o polo eletroeletrônico.
Contudo, sua elite dirigente foi incapaz, até então, de utilizar os recursos financeiros arrecadados através do Projeto ZFM no sentido de alcançar-se uma solução econômica independente, via desenvolvimento tecnológico dos insumos e potencialidades regionais com aplicabilidade industrial.
De forma incompleta, idealizou uma Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (Fucapi), formadora de técnicos de 4.º grau (por si só, um aspecto favorável!) convergente com a linhagem da indústria de consumo de bens eletroeletrônicos, cuja fronteira tecnológica expande-se aceleradamente, determinando uma defasagem maior do que aquela verificada no início dos anos 60. A alternativa da indústria de componentes, concebida com sua ajuda, revelou-se um fiasco, além de insuficiente para a autossustentabilidade desejada e necessária.[2]
A liberdade econômica somente dar-se-á com poupança e tecnologia regional, as quais, num primeiro momento, dependem de muita ousadia e de gigantesca vontade política, ao mesmo tempo de desprendimento politiqueiro. Oxalá o ideário prático de Terceiro Ciclo[3] do atual Governo do Estado do Amazonas redunde eficaz para as próximas gerações de amazônidas, como acreditamos tenha sido o desejo quando o governo de Gilberto Mestrinho elaborou o Plano Estratégico de Desenvolvimento do Amazonas - Planamazonas, enquanto linha mestra de ação governamental.[4]
Lamentavelmente, esqueceu-se de criar, ou somente agora se vislumbra, as condições de produção em escala da nossa piscicultura, da nossa farmacologia, do nosso ecoturismo, etc. Fala-se da necessidade de missões para atrair o capital asiático, por exemplo, para a implementação de plantas industriais de ponta, mas se esqueceram de fazer caminhadas ao capital regional levando propostas de investimentos concebidas a partir de uma tecnologia baseada nas nossas potencialidades de produção. De certo que além de buscar a produtividade e a competitividade da produção eletroeletrônica, temos que conceber nossos próprios índices inerentes à produção regional. Uma coisa é competir, outra bem diferente é buscar competir de igual para igual.
A própria Fundação Centro de Apoio ao Distrito Agropecuário (Fucada), idealizada pela Suframa aos moldes da Fucapi, portanto sua co-irmã, desprestigiada ao longo de sua existência e em estado de desagregação,[5] é o retrato do ineficaz caminho adotado para prover a Amazônia da tão desejada autossustentabilidade. Sempre haverá tempo para as revisões: seu acervo e suas experiências técnicas bem que poderiam ser absorvidas pela Fucapi, fazendo-se surgir um Departamento Agroindustrial, direcionado ao desenvolvimento da tecnologia e produção regional. Recursos financeiros, com um pouco de boa vontade política, haveria. Para tanto, bastaria despriorizar os calçadões, as praçinhas, etc., bem como zelar para contratar obras e serviços a preços justos e de mercado.[6]
III. Finalizando, a nosso ver, e a continuar a metodologia de gerenciamento do Projeto ZFM adotada ao longo de sua história, nossos descendentes confirmarão, com amargura, que o mesmo cumpriu apenas e tão-somente o mesmo papel do Ciclo da Borracha, isto é, o de possibilitar e favorecer a reprodução da nossa elite sociopolítica [e a reprodução de capital estrangeiro, na forma de mais-valia global – aditado em 2011].
Antes que seja tarde, antes que se dilua a salvaguarda constitucional, cuja “canetada” está prevista para 2013 (mais uma vez prolongado para outro horizonte, agora 2023, antes de 2013 era 1987), mas que nada impede seja dada antes, função da fragilidade política do Projeto ZFM, unamos, desprovidos de interesses pessoais e partidários, a sua institucionalidade à da Fundação Universidade do Amazonas - FUA, à do Banco da Amazônia - Basa, à do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia - Inpa, à da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa, ao Serviços de Apoio a Micro e Pequena Empresa do Amazonas (Sebrae/AM), e de outras que visem o desenvolvimento econômico da Amazônia ocidental, objetivando configurar uma real solução socioeconômica e o assento efetivo no tabuleiro do jogo político-econômico nacional e internacional [hoje, poderíamos adicionar o sistema Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia-Sect/Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas-Fapeam, líder do sistema PÚBLICO de inovação de Manaus, que se deseja simplesmente Sistema Manaus de Inovação-SMI, ordenado por uma hélice tríplice aonde conste na dimensão da indústria firmas com capital local].[7]
[1] Reflexão elaborada em 1994 e reproduzida em 1996 e em 2006 com a publicação do Redesenhando o Projeto ZFM.
[2] Guardadas as devidas proporções, hoje, poder-se-ia ler: Centro Tecnológico do Polo Industrial de Manaus [CT-PIM].
[3] Ideário desencadeado pelo governador Amazonino Mendes simbolizando a possibilidade do desenvolvimento ecnonômico a partir do mapeamento das áreas agricultáveis no interior e investimentos em infra-estrutura para escoamento da produção e penetração de insumos agrícolas. O concernete discurso político estava permeado, ainda, pelas potencialidades da indústria verde ou ecoturismo e da indústria da mineração. Hoje, foi substituído pelo Programa Zona Franca Verde, que agregou, de forma positiva, o ideário do desenvolvimento sustentável.
[4] Hoje, poder-se-ia ler: Evolução das Políticas de Desenvolvimento Sustentável no Estado do Amazonas – 2006-2009.
[5] Hoje, o seu estado é de liquidada!
[6] Guardadas as devidas proporções, hoje, poder-se-ia ler: Centro de Biotecnologia da Amazônia [CBA].
[7] Bem que essa remota possibilidade poderia ser agregada à nova missão institucional delineada para a Suframa com o seu Planejamento Estratégico editado em dezembro de 1994, e ratificada através do seu Sistema de Planejamento aprovado pela Portaria n.º 403/95, de promover investimentos, além de administrar incentivos fiscais; promoção no sentido maior, seletivo, tendo em vista o desenvolvimento econômico da Amazônia ocidental. Este é, no nosso entender, o necessário estado de alerta que todo amazônida deveria adotar, evidentemente, com nuances específicas à cada visão de mundo político-ideológico individual, mas, certamente, voltado para a busca da liberdade econômica e política da Amazônia ocidental, maximizando a oportunidade do Projeto ZFM e afastando, de vez, o fantasma da era de abundância perdida com o Ciclo da Borracha. Esta é, enfim, a nossa modesta contribuição no sentido de se configurar possibilidades de postos de trabalho e renda para a geração futura de amazônidas; uma possibilidade de vida mais digna, onde o crescimento econômico não seja excludente à qualidade de vida. Essa caneta não veio e provavelmente não virá, pois, neste ano de 2011 a expectativa é de que, em 2012, o Projeto ZFM seja prorrogado até 2050. Porém ainda estamos longe de uma solução em prol do desenvolvimento autossustentável.

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