20/11/2025

EM PROL DAS AMAZONIDADES!

 

Desenvolvimento Libertário: uma fórmula política para Manaus[1]

 

E

laboro essa reflexão com o propósito de, mais uma vez, contribuir para o capital social de Manaus. A ideia fundamental é associar o conceito de liberdade libertária vinculado à teoria anarquista com a possibilidade de se criar um desenvolvimento mínimo e adequadamente autônomo na esteira das amazonidades vertidas à lógica da sustentabilidade. Ou seja, adotar politicamente um ideário de desenvolvimento para todos os locais da Amazônia a partir de sua individualidade diferencial frente à sua dependência com relação ao capital e à tecnologia de outros locais nacionais e internacionais mais “avançados” industrial e tecnologicamente falando.

Para tanto, inicio com o que utilizei de Roberto Freire e Fausto Brito para tentar conceituar liberdade libertária na minha brochura Toques Anarquistas: contribuição para uma visão de mundo alternativa, publicada no Rio de Janeiro em segunda edição, em 2007, pela Editora Achiamé e lançado em Manaus em dezembro, no Chapéu de Zinco da Associação dos Moradores do Bairro de Petrópolis (Somap).

Peço que mais-do-que-leiam, na verdade sintam, para continuarmos no meu raciocínio. Peço que aceitem a associação entre indivíduos, tomados na concei­tuação abaixo, com a figura política de espaços nacionais, cujo desenvolvimento é obtido com a ação de firmas locais inseridas em ambientes inovadores. No caso, tomo a espécie humana, enquanto categoria de indivíduos, como equivalente a Manaus, cuja industrialização se dá com o Projeto ZFM, sendo sua maior expressão de evidência o Polo Industrial de Manaus [PIM]. A nota de rodapé da página 32 do Toques Anarquistas está assim, já adaptando ao presente propósito:

 

Não é fácil escapar do modo de pensar capitalista, ao qual nós estamos sujeitos, para arriscar uma pequena definição conceitual do que se poderia entender por liberdade libertária.

De toda sorte, entendo que ela está estreitamente vinculada à questão da individualidade diferencial de cada um em relação a si mesmo e a todos, no sentido de explorá-la positivamente, de buscar a evasão da opressão e da alienação determinadas por aquele modo de pensar. Roberto Freire e Fausto Brito, no livro "Paixão & Utopia: a política do cotidiano", editado pela Guanabara Koogan, no Rio de Janeiro, em 1991, desenvolveu [página 37] assim a ideia do que denominei individualidade diferencial:

... o que importa é a diferença que resta: o original e único em cada um. A sociedade tradicionalista conservadora e burguesa-capitalista e a socialista-burocrática procuram e querem da pessoa a sua semelhança com as outras. Porque isso a torna mais fácil de ser controlada. E renegam, condenam, excluem, caçam e destroem a diferença. Acontece que, na verdade, cada um é mesmo a diferença: somos essencialmente o que faz nossa originalidade biológica e humana.

Então, ser livre é poder viver ampla e irrestritamente as próprias originalidades únicas, as nossas diferenças. Como? Fundamentalmente, no jeito de amar e de criar. E é exatamente sobre o jeito de amar e de criar de cada um que se exerce a repressão autoritária, o controle social, a favor das semelhanças e pela massificação da média [sinônimo ao mesmo tempo de ninguém e de todos].

Enfim, a liberdade consiste em não se submeter aos obstáculos, à autorregulação espontânea. Consiste em superar a tudo e todos que, unidos e fortes, procuram impedir o exercício das potencialidades espontaneamente revolucionárias em todas as pessoas.

 

É, portanto, como se imaginássemos duas frações matemáticas em que a primeira fosse infinitamente superior do que a segunda relativamente à liberdade libertária. Nesse sentido, o numerador da primeira seriam as diferenças [amazonidades] e o denominador, o somatório das diferenças e semelhanças [amazonidades + PIM] de e para cada ser humano; o numerador da segunda seriam as semelhanças [PIM] sobre o mesmo denominador. Assim,

 

Diferenças

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(Diferenças + Semelhanças)

 

> > > >.........

Semelhanças

------------------------------------------

(Diferenças + Semelhanças)

 

É com base nessa função matemática que peço que reflitam sobre a fração abaixo (imagine-a), que chamo de desenvolvimento libertário associando-o à lógica de uma perspectiva de liberdade libertária. Faço a simulação, adotando como numerador a potencialidade AMAZONIDADES e como denominador a evidência ECONOMIA DE ENCLAVE INDUSTRIAL, o PIM em transformação para um ambiente construído de vantagens competitivas dinâmicas valorizando, privilegiando AMAZONIDADES, em superação à simples lógica da atração de investimentos a partir da oferta de vantagens competitivas estáticas.

As setas para cima (imagine-as), tanto no denominador, quanto especialmente no numerador, indica que aqui não se trata de negar o Projeto ZFM, mas de tratar suas contradições internas de frente, com vistas a um determinado futuro desejado e normativo, no sentido de não só apenas exploratório, como reflete o discurso e a prática política local, regional e nacional, ao gastar mais energia, expressa em tempo, dinheiro e inteligência com a manutenção de vantagens competitivas estáticas com que a construção de vantagens competitivas dinâmicas. Ao adotar, enfim, o Projeto ZFM como um fim em si mesmo, ao invés de um meio para as transformações social, econômica e política de Manaus e dos locais amazônicos. Observe-se que a seta para cima no denominador, aponta, inclusive, para esse rumo normativo. A seta maior (imagine-a), totalizada integralmente pelo resultado da fórmula, sinaliza a liberdade política e a independência econômica de Manaus, ou de qualquer local amazônico.



Caixa de Texto: Amazonidades: Transformação de insumos e saberes da floresta amazônica em produtos (bens e serviços) e processos realizáveis ou realizados no mercado - sentido econômico - resultante da aplicação de capital local (empreendedorismo) combinada com tecnologia limpa e endógena - sentido ideológico - condicionada por e ao mesmo tempo condicionando uma sustentabilidade socioética-ambiental-ecológica - sentido civilizatório. Vide uso em "Redesenhando o Projeto ZFM: um estado de alerta!". O ideário, vertido à construção da liberdade política e independência econômica da Amazônia e imanente à lógica do desenvolvimento sustentável, também pode ser encontrado nas reflexões de Armando Mendes e Ozório Fonseca. 14:19, 21 maio 2007 (UTC) Antônio José Botelho

Caixa de Texto: Economia de Enclave (industrial): economia posta em um espaço subperiférico entendida como toda aquela que roda com capital e tecnologia exógenos, atraídos mediante vantagens competitivas estáticas (fundamentalmente incentivos fiscais), onde os lucros retornam aos donos do capital residentes em outras plagas e a tecnologia do chão de fábrica é inteiramente assimétrica com o chão da academia local, constituindo a passagem para uma economia autossustentada a construção de vantagens competitivas dinâmicas que oportunizarão não só a consolidação das firmas existentes mas, sobretudo, o desenvolvimento do empreendedorismo local a partir da emergência de empresas de base tecnológica, cujos produtos e processos estabeleçam sintonia com os insumos, os saberes e a cultura local (amazonidades para o caso dos locais do chão amazônico), enquanto estratégica de inserção positiva e inteligente no contexto da globalização contemporânea, assegurado o consumo local. o termo pode ser encontrado em "Redesenhando o Projeto ZFM: um estado de alerta!". 13:47, 22 maio 2007 (UTC) Antônio José Botelho

 

Tomem como pressuposto dessa perspectiva o fato de que a organização planetária é estruturada em Estados nacionais e que seu sistema econômico dominante é o capitalista, o qual, que por sua vez, tem no capital seu vetor principal de propriedade privada e na tecnologia sua mercadoria mais nobre [igualmente utilizada como propriedade privada].

Tomem também como pressuposto que a soberania, transcendendo à dualidade absoluta e relativa, é resultante não só mais do poder político sobre o território, mas igual e complementarmente da forma como os capitais sociais dos locais se arranjam em função da produção e distribuição dos produtos e serviços que servem às suas respectivas sociedades. Os resultados econômicos dessa ambiência de empreendedorismo impregnada da cultura da inovação e do crédito adequado, em última análise, devem ganhar o mundo.

Nessa esteira de raciocínio, não consigo entender a Amazônia soberana somente pela atração de investimentos. Aqui tem nada de xenofobismo, mas da elevação ao orgulho legítimo pela construção do desenvolvimento com liberdade política e independência econômica. Esse orgulho se manifestaria, sobretudo, pela emergência de firmas com capital e tecnologia local. Não se tem como comparar a produção high tech PIM, em si mesma perfeitamente mensurável, com as amazonidades enquanto potência. Claro que não, mas não se trata de metrificar e sim, de criar amazonidades.

Assim, seria como na lógica metafísica profano-divino, associando-a, respectivamente, ao manifesto [produção high tech] e ao imanifesto [amazonidades]. Isto é, devemos buscar a transcendência dentro do conteúdo da matéria, transformando em concretude as amazonidades.

Essa transcendência dentro da natureza material e política da dimensão manifesta dos homens dos locais da Amazônia, e no caso presente de Manaus, oportunizaria uma relação custo/benefício extremamente favorável para o desenvolvimento amazônico em bases soberanas, na medida em que o numerador criado e realizado seria infinitamente maior do que as evidências hoje metrificadas da produção high tech.

A Amazônia é um sítio único deste planeta e com singularidade deve ser trabalhada pelo menos enquanto perdurar sua organização social planetária em Estados nacionais, politicamente configurados em territórios que privilegiam seus capitais e suas tecnologias. Para tanto, devemos criar nosso próprio capitalismo, como dito acima, no sentido de mínima e adequadamente autônomo, estruturado no desenvolvimento sustentável, com investimentos verdes, tecnologia limpa, consumo inteligente etc. etc. Esse desafio se supera com políticas de oferta e demanda industriais e tecnológicas convergentes etc. etc.

Para começar fica a proposta de se medir o crescimento econômico de Manaus com base no conceito de Produto Nacional Bruto - PNB, ou melhor, Produto Manauara Bruto, ao invés de Produto Industrial Bruto – PIB. Com isso, teremos a clara percepção de nossa dependência por grandes capitais e tecnologias exógenas.

Essa é outra forma de dizer, de escrever, o que já venho dizendo, escrevendo há algum tempo. E olha que não sou o primeiro, apesar de poder estar sendo original, com a adoção de um paralelo esdrúxulo, como poderiam argumentar sobre o anarquismo, aqueles mais afeitos a modelos cartesianos. O link entre o paralelo, a argamassa que agrega esperanças aparentemente contraditórias está na perspectiva da solidariedade que permeia tanto o princípio do anarquismo, quanto o princípio do desenvolvimento sustentável. Solidariedade social. Solidariedade política. Solidariedade cultural. Solidariedade institucional. Solidariedade ecológica. Solidariedade ambiental. Solidariedade econômica. Solidariedade religiosa. Essas são as trilhas tanto do anarquismo quanto da sustentabilidade.

Após a análise e reflexão, verão que não há nada de extraordinário nessa minha abstração. Tenho certeza que para a consciência de cada qual vertida à uma Amazônia livre e independente, minha abstração será perfeitamente convergente.

A partir do conceito de liberdade libertária derivado do anarquismo fica mais fácil, pois a teoria anarquista prima pelas diferenças entre os indivíduos. De igual forma, a Amazônia deve ser adotada e privilegiada como algo absolutamente diferente.

Os sistemas capitalista e socialista-real aparelham ideologiamente os indivíduos pelas semelhanças. Desta forma, fica possível um maior controle social mantenedor do status quo. O primeiro vitorioso – até o momento contemporâneo – fez o segundo sucumbir ao desenvolvimento tecnológico convertido em consumo de massa, aplicando um controle social muito mais refinado.

A liberdade libertária, preconizada pelo anarquismo, que está acima da liberdade civil, econômica, política e religiosa é visível matematicamente lançando as diferenças no numerador ao invés das semelhanças, estando no denominador a soma de ambas as variáveis.

Para a associação das amazonidades como diferenças e do PIM como semelhanças é passo... Do ponto de vista do crescimento econômico podemos entender Manaus condicionada à trajetória tecnológica derivados dos pacotes tecnológicos exógenos. A base tecnológica da microeletrônica, das TIC’s, da nonotecnologia, de novos materiais, etc., devem estar a serviço, sobretudo, para a emergência de amazonidades, isto é, se tivermos energia, disciplina, coragem e determinação poderemos inverter o jogo do nosso desenvolvimento contribuindo de forma sustentável para um novo marco civilizatório.

Finalmente, tomo a liberdade de fazer homenagem sincera ao Armando Mendes.[2] Ele o primeiro a adotar, segundo meus registros históricos, o conceito de amazonidades numa expressão muito mais larga do que a minha adaptada à lógica da produção e distribuição de produtos e serviços com base em insumos e saberes da floresta, porque a insere na dimensão cultural, como mesmo o conceito de brasilidade. Igualmente, homenageio Ozório Fonseca, um articulista local de referência, que trabalha em seus artigos amazonidades todas as semanas.

 



[1] Reflexão inicial do livro Sínteses & Reflexões: em prol das amazonidades como ideário de desenvolvimento, de Antônio José Botelho, publicado em 2010 pelo www.clubedeautores.com.br .

[2] Armando Mendes, em seu livro Amazônia: modos de (o)usar, publicado pelo Editora Valer, em 2001, anuncia e pronuncia assim, às páginas 82-88, as específicas amazonidades sob sua perspectiva ontológica-ecumêmica-ecológica-profética-produtiva: “Toda e qualquer amazonidades não é senão um caso particular, localizado, da acepção e da concepção gerais de regionalidade. É a feição desta nossa realidade, tanto por obra e graça da natura do sítio, quanto por artes e manhas (artimanhas quem sabe) da cultura nele situada. Não, entretanto, as expressões que venham a defluir de conjunturas econômicas e sociais ou políticas, e sim, as de contextura natural e humanal ou antrópica. Quer dizer: as singularidades amazônicas permanentes, continuadas, as ‘normais’. As geradas in loco e sponte sua, não as contraídas por contágio ou por exposição a outras influências. Salvo, entre estas, as assimiladas e transfiguradas pelo espírito do lugar, que ninguém vive num insular pequeno mundo à margem da multidão. Serão, então, amazonidades derivadas ou adotivas... Acrescente-se: formando bem regionalmente, e com perdão pela insistência, cestas ou paneiros ou cofos de empreendimentos agroindustriais beneficiados por economias de escala e de aglomeração, integrando toda uma extensa cadeia produtiva. Integrada vertical e horizontalmente. Produzindo para robusto mercados forâneos, insisto, aquilo que nos é peculiar [grifei]. E oferecendo até, no primeiro momento, à revelia de uma prévia procura efetiva – a oferta abrindo por mérito próprio clareiras [na vereda normativa; adicionei] e nichos autônomos, perduráveis, para os nossos ‘exóticos’ produtos, em mercados idióticos... Mais: retendo na região os lucros gerados, e reinvertendo-os. Multiplicando internamente (internalizando, não internacionalizando) renda e emprego... Fixando, dessa maneira, de maneira condigna, em nosso interior, populações que na ausência de uma estrutura econômica encadeada ficariam, como em larga medida têm ficado, à deriva. Assumindo, em última instância, as rédeas da nossa caminhada. Praticando, como necessário, em função do seu maior empenho, o melhor dos seus desempenhos. Um desempenho atlético.” Ver-se-á, claramente, que a conceituação que este autor adota de amazonidades está contida na conceituação mais ampla de Armando Mendes, que em nota de rodapé adiciona: “Amazonidade(s), como regionalidade, à semelhança de brasilidade, latinidade, lusitanidade, mineiridade, todos os vocábulos dicionarizados e portando, portanto, carteira de identidade”. Em verdade, deve estar registrado que a sua “Bula Amazônica, comportando uma utopia prospectiva, um projeto propositivo e uma agenda prescritiva” contém, também, o conceito growing up que este autor adota como campo de ação da sua versão restrita de amazonidades, apenas ajustado a códigos quais fronteira tecnológica, sistemas locais de inovação, trajetórias tecnológicas, dentre outros. Ozório Fonseca também adota a definição de amazonidades idealizada por Armando Mendes, tendo, inclusive, registrado trechos da mesma no prólogo do seu livro intitulado Amazonidades, justificando, portanto, o título. Nesse livro, cuja edição está esgotada, Ozório Fonseca reuniu cem artigos publicados no Jornal do Commercio, a qual foi editada para comemorar cem anos daquele Jornal.

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